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Sobrevivendo aos ambientes urbanos - Vidros!

Eduardo Guimarães





Seguindo o tópico dos impactos dos ambientes urbanos na fauna selvagem, pretendo neste texto abordar um tema bem doloroso, mas necessário: o impacto das vidraças para as aves. Sim, é isso mesmo, o vidro causa um impacto enorme nos animais, segue a leitura que você vai entender…

Impacto das vidraças para os animais

Você já se deparou com a situação vergonhosa de não ver uma vidraça e acabar batendo com a rosto, sem entender ao certo o que aconteceu? Me lembro que uma vez saindo de uma loja de skate na Ceilândia (na época era um skatista fanático, concorrendo em campeonatos e com o sonho de ser um profissional do esporte rs), isso aconteceu comigo. Me lembro da vergonha que foi. Sim, o vidro estava tão limpo que ficou transparente para mim. Apesar disso, eu não sofri nenhum dano físico, apenas uma vergonha que me perseguiu pelo restante do dia. Mas, por que estou contando essa história? Porque, para os animais, não ver uma vidraça pode ser fatal. Veja o vídeo abaixo, enviado por um conhecido de Brasília, gravado pela câmera de segurança da sua casa.


A espécie no vídeo é o papagaio-galego (Alipiopsitta xanthops). Esse papagaio é comum em Brasília, apesar de poucas vezes eu ter avistado a espécie nos ambientes mais urbanizados. É um papagaio de pequeno porte que costuma voar em grandes bandos (ainda bem que o animal no vídeo estava sozinho, ou poderia ser pior). O papagaio-galego é uma espécie muito bonita que faz seus ninhos em oco de árvores, de palmeiras ou buracos em cupinzeiros. Além disso, a espécie possui um repertório vocal amplo, ou seja, os animais dos bandos se comunicam. Veja por exemplo o trabalho do professor Carlos Araújo, que gravou esses animais aqui em Brasília e descreveu sete tipos de sons, voltados para diferentes objetivos como indicar área de alimentação e avisar possíveis predadores. Como comentei em outro texto, os animais conversam bastante, a gente que ainda não aprendeu a entender tudo.

Na primeira vez que assisti o vídeo, demorei para entender de onde o animal veio. Tive que repetir três vezes. O relato da pessoa que me enviou o vídeo foi que escutou um barulho enorme e correu para ver. Inicialmente pensou que o animal estava morto, mas a morte não foi instantânea. Corremos para socorrer o animal, liguei para os amigos do Zoológico de Brasília (que faz o atendimento de animais selvagens com ferimento aqui em Brasília, uma parceria com o CETAS e o IBAMA), o animal foi atendido, mas morreu em poucas horas. Como disse no início, o relato é triste, mas mostra o ponto que pretendo abordar: os vidros matam os animais! O mais triste é que nem sabemos ao certo qual o impacto dessas mortes para as populações de animais. Quantos morrem? De quais espécies? Onde é mais comum essas colisões com vidraças? Essas mortes afetam as populações locais?

Ao redor do mundo existe uma discussão sobre o tema. Nos Estados Unidos, por exemplo, uma revisão estimou entre 365 e 988 milhões aves mortas por ano, sendo que a maior parte das mortes ocorreram em prédios baixos. Os autores concluem, com base nos seus resultados, que a colisão com os vidros só perde para os gatos-domésticos em relação ao número de mortes de aves (Falei sobre os gatos-domésticos em outro texto). Quantas aves morrem anualmente no Brasil? Quantas em Brasília? Ainda não sabemos, mas acredito que não fique tão distante dos resultados vistos nos outros países. Sim, precisamos pensar sobre isso.

Aves que sofreram colisão: a) Archilochus colubris e b) Icteria virens - Leia o artigo das imagens aqui

Tendo em vista que os animais colidem com os vidros pois não os identificam como uma superfície sólida, o passo lógico é tornar esses vidros visíveis aos animais. Claro que não vamos conseguir pintar todos os vidros de prédios e viver nas sombras. Os vidros fazem parte de nossa história, sendo amplamente utilizados em todo o mundo. Vamos ser realistas.

Então, o que fazer?

Não pretendo discutir todas as propostas sugeridas para resolver o problema. Vou apenas citar que já foram propostas algumas alternativas: vegetação próxima aos vidros (um ponto de parada para o animal que evitaria bater do vidro), espaçamento curto entre os vidros (tornando mais visíveis para as aves), ângulo de colocação do vidro (aumentando a visibilidade do vidro pelas aves), etc. Quero discutir um pouco o método que me parece mais factível de realmente resolver o problema: o vidro reflexivo.

Já temos tecnologia para tornar os vidros visíveis apenas para as aves. Sabemos hoje que as aves enxergam melhor que nós humanos, chegando a ver frequencias de cores que chegam ao Ultra Violeta (UV). Isso se reflete na diversidade de cores que é observado nos animais nos ambientes naturais, mostrando a importância da visão para a sobrevivência do grupo. Assim, podemos fazer um vidro que seja visível para as aves e que nós não enxergamos. De fato, já fizemos. Veja a imagem abaixo de um vidro com essa tecnologia, exemplificando a diferença entre o que vemos (à esquerda) e as aves veem (à direita).


Fora do Brasil as empresas estão investindo em modelos de vidros para evitar as colisões, reduzindo as mortes dos animais. Afinal, ninguém fica feliz em ver os animais mortos, principalmente quando assiste ao momento da colisão (como no vídeo mostrado). Parece lógico que, em um futuro próximo, todos os vidros sejam reflexivos e possamos focar em outros problemas que ainda não possuem soluções claras.

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